Há um mês iniciei o trabalho do projeto Festival Outros
Nativos, desdobramento da minha atuação como empreendedor social no bairro da
Sacramenta. Este é um relato de um dia típico com outros empreendedores sociais do bairro
Sexta-feira, 15 de fevereiro. Cheguei com Samuel e Saul,
irmão que fazem a Batalha do Elevado na Praça Dorothy Stang. Mal estacionei o
carro e nos deparamos com a cena: cerca de 15 pessoas com as mãos na cabeça e
pernas abertas no meio do anfiteatro enquanto cinco guardas da Rondac (tropa de
elite da Guarda Municipal) de metralhadoras, motos, capacetes e mascaras na
cara. Muk (Samuel) fica logo indignado: “Olha, esses caras!! O que estão
fazendo!?”.
Lembrei do depoimento do dia anterior de Fartura Baby para a
matéria que estou fazendo sobre a Batalha do Elevado: “ A Polícia tem que parar
de atuar maleficamente no movimento e atuar positivamente”. Digo pra Muka ficar
na dele e desembarcar as coisas do celtinha enquanto eu me dirijo aos guardas
municipais com minha pele clara, minha barba grisalha e minha camiseta preta
dos Sex Pistols escrito “Pretty Vacant”.
Faço fotos enquanto me dirijo por trás da arquibancada do anfiteatro
onde um dos guardas dá cobertura, de metralhadora na mão.
Ele me cumprimenta
enquanto eu subo o grande degrau da arquibancada e me pergunta se tem algum
parente meu ali entre os revistados. Eu digo que não e tento explicar que vou
desenvolver um projeto social ali com apoio da Prefeitura. Ele entende que eu
sou servidor público. Eu explico minha condição de morador do bairro. Ele se
justifica diz que é um procedimento normal e que são pessoas de bem (os
revistados). Mostra um grupo de crianças que estão a seu lado direito. Ele as
tirou do grupo de pessoas que estão revistando porque sentiram um cheio forte
de maconha. E disse que, nesses casos, o Estado só atua quando a situação foge
ao controle.
Pergunto por que não existe policiamento constante como nas
praças do centro da cidade e uso talvez erroneamente a expressão “policiamento
ostensivo”. Ele ponta os colegas na revista e diz: está aí!. E disse que mais
cedo tinha acontecido a mesma coisa no Horto Municipal (Centro da cidade). O
papo se encerra gentilmente. Desejo boa tarde e bom trabalho. Eles terminam revista
e vão embora pelo meio da praça passando por cima da grama mal aparada. A gente
prepara o equipamento para a batalha do rap. É só mais um baculejo na quebrada.
Dessa vez não teve assalto, prisão nem morte.
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